Wednesday, March 30, 2016

Recordações escolares: ensino fundamental e médio


Hoje lembro das escolas onde estudei e das boas experiências que tive: vivências de amizade, aprendizados, trabalhos em grupos, alguns poucos contatos com as artes, com a política, etc. Contudo, essas vivências se deram pelo fenômeno natural da vida, no encontro com os outros e na interação com o mundo, pois não fazia parte das propostas das escolas.
            Relembrando a minha vida escolar como um todo, vejo que à medida em que fui crescendo, as vivências na escola ficavam mais duras e toda manifestação que envolvia arte ou política estava muito mais atrelada aos atos transgressores dos estudantes do que às propostas pedagógicas. O tempo foi passando e, impositivamente, os meus objetivos educacionais foram, cada vez mais, se afunilando em direção à meta do vestibular.
            Lembro que durante o ensino fundamental eu e meus amigos percebemos que no nosso ano letivo não havia nenhum festival cultural ou mesmo uma feira de ciências. Então pleiteamos esse direito junto à direção da escola e conseguimos realizar uma semana cultural em que toda a escola preparou trabalhos coletivos interdisciplinares que valeriam nota. Conseguimos fazer um trabalho sobre resíduos sólidos no qual envolvemos matemática, química, biologia, geografia e até português, pois criamos um livreto de cordel sobre o tema.
            Com esse mesmo grupo, também conseguimos instaurar um dia diferente na escolha das músicas que tocavam no recreio, pois o grêmio da escola escolhia sempre as músicas da moda e nós então pleiteamos e conseguimos negociar um dia para o “rock” e outros estilos musicais.
            São coloridas as lembranças dos meus tempos de infância e adolescência, com o tempo, a riqueza dessas experiências foram se tornando escassas, mas, olhando para trás, vejo que tive algumas oportunidades de participar de processos de criação artística e que também vivi sabores revolucionários quando resolvi, junto aos meus colegas, questionar as práticas da escola, pleitear direitos, desenvolver algum gosto pela política e compreender, na vivência, o seu papel, a sua importância na nossa vida individual e coletiva. Coisas que só se vive na convivência, na experiência, na curiosidade e na necessidade de aprender. De certa forma, em alguns momentos a escola me ensinou por meio do contrário, ou seja, aprendi como não ser e contra o que eu deveria lutar, a como não ficar totalmente parada e passiva diante da opressão, da injustiça, etc.

A luta hoje tão atual contra os alarmantes índices de reprovação que gera a expulsão de escandaloso número de crianças de nossas escolas, fenômeno que a ingenuidade ou a malícia de muitos educadores e educadoras chama de evasão escolar, dentro do capítulo do não menos ingênuo ou malicioso conceito de fracasso escolar. No fundo, esses conceitos todos são expressões da ideologia dominante que leva as instâncias de poder, antes mesmo de certificar-se das verdadeiras causas do “fracasso escolar”, a imputar a culpa aos educandos. Eles é que são responsáveis por sua deficiência de aprendizagem. O sistema nunca. É sempre assim, os pobres e miseráveis são os culpados por seu estado precário. São preguiçosos, incapazes (FREIRE, 1994, p. 119 e 120, grifos do autor).

            Um filme passa no meu imaginário quando busco revisitar minha trajetória escolar, lembro de coisas que aprendi pela experiência e convivência, momentos em que me deparei com o preconceito, a discriminação a competição e, também, com a solidariedade e com a amizade. Aprendizados que estão em mim muito mais latentes do que boa parte da teoria exposta na sala de aula durante todos os anos da vida escolar.
Não quero dizer que as vivências sociais, culturais, artísticas e políticas são mais importantes que o conhecimento teórico, mas que são tão fundamentais quanto. Convêm destacar a justa importância às relações interpessoais que são oportunizadas no fazer pedagógico, nos espaços da escola e da comunidade. Experiências que, muitas vezes, a escola negligencia ou considera secundárias, mas que, na verdade, deveriam ser vistas como centrais no processo educacional, pois são da ordem do crescimento pessoal e da sensibilidade e, por serem experiências vividas, deixam memórias que se inscrevem de um jeito muito latente e sensível em nós. Esse tipo de crescimento é, inclusive, o que nos dá base para uma boa atividade intelectual.