Não é possível ser feliz. Ninguém nunca conheceu o que é a felicidade, pois, assim como a liberdade, ser feliz só é possível coletivamente. É impossível a felicidade genuína num mundo onde tantos sofrem por desamor, onde há tanta gente doente e abandonada nas calçadas.
A gente sonha com a felicidade, fotografamos nossos sorrisos e ostentamos os momentos alegres, mas feliz mesmo ninguém é. Quem pensa ter felicidade é porque vive preso na propria individualidade e esta é ilusão. Liberdade individual não existe, é privilégio disfarçado. Empoderamento individual é mentira, é o desvirtuamento da palavra para vender ideologia de prateleira que nos ensina um "salve-se quem puder e dane-se o resto".
Algumas pessoas consideradas mestres falam de felicidade, liberdade, Educação, sem falar da luta humana coletiva para construir tudo isso de forma verdadeira, ou seja, para todos e todas. Quem cai nessas conversas e compra essas ideologias é porque, consciente ou inconscientemente, está preso no individualismo e no egoísmo. Isso causa cegueira. Não somos nada sem nossa História de lutas, não somos ninguém se não honramos nossa ancestralidade. Palavras vazias em tom de palestra é oportunismo. Alimentar-se destas ideologias individualistas é absorver uma cegueira e uma anestesia social que se espalha feito droga e vício e cai como uma luva nas classes sociais privilegiadas que desejam "despertar", pois virou moda, virou consumo.
Não quero dizer que devemos nos assumir tristes e infelizes, ao contrário, quero dizer que é preciso ultrapassar o individualismo e o egoísmo, que é preciso ir além das aparências na tarefa de "despertar". É preciso estar atento e saber que qualquer teoria que não reverencie os ancestrais (bases e fundamentos) e a coletividade é ilusão. Devemos sorrir e viver com alegria, pois sem isso não temos forças para lutar, mas viver apenas para si e para seus pares é estar preso na bolha, é deixar-se levar pela ideologia dominante, é pensar que está despertando, mas, na verdade, está cego e fazendo parte de um movimento que apenas gira em torno de si sem sair do lugar. Que a cada sorriso possamos abrir os olhos, a cabeça e o coração com coragem.
Este é um desabafo sobre discursos que tenho visto no campo da Educação, tanto nas leituras teóricas, nos estudos, quanto no corpo-a-corpo dos fazeres educativos, em escolas, coletivos, na formação de educadores, na construção da ideia de "Educação Inovadora", de "Educação do Século XXI", etc.
Há uma estratégia discursiva que é afirmar algo que ninguém vai discordar, como, por exemplo, que as crianças devem ter contato com a natureza para um desenvolvimento saudável, mas a partir dessa afirmação pode haver diferentes visões de mundo, projetos de sociedade e, inclusive, a ideia de que os problemas ambientais decorrem da nossa falta de amor à natureza, ou seja, o discurso que culpabiliza o indivíduo pela degradação ambiental, mas isenta o capitalismo da exploração socioambiental que exerce e que impacta a natureza em proporções estratosféricas. Assim, muita gente bem intencionada acaba construindo um discurso que pode ser facilmente apropriado pelo capitalismo e ser utilizado como argumento que reforça as ideologias alienadoras e individualistas.
É claro que a atitude individual é importantíssima e que nós indivíduos impactamos na natureza. Há muito que se pode fazer no campo do indivíduo, na mudança do estilo de vida, etc. Justamente por isso ser tão importante, consensual e de fácil aceitação, é vendido como discurso dominante, o que acaba reforçando nossa socialização que, nos moldes do capitalismo, deve ser alienada, individualista e maquiada com benevolência.
Acredito que paz de espírito é lutar contra a alienação e exploração predatória da sociedade, das culturas e da natureza, com certeza isso começa no indivíduo, mas é agindo no mundo e com os outros que realmente nos transformamos. ♡
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