Hoje
lembro das escolas onde estudei e das boas experiências que tive: vivências de
amizade, aprendizados, trabalhos em grupos, alguns poucos contatos com as
artes, com a política, etc. Contudo, essas vivências se deram pelo fenômeno
natural da vida, no encontro com os outros e na interação com o mundo, pois não
fazia parte das propostas das escolas.
Relembrando a minha vida escolar
como um todo, vejo que à medida em que fui crescendo, as vivências na escola
ficavam mais duras e toda manifestação que envolvia arte ou política estava
muito mais atrelada aos atos transgressores dos estudantes do que às propostas
pedagógicas. O tempo foi passando e, impositivamente, os meus objetivos
educacionais foram, cada vez mais, se afunilando em direção à meta do
vestibular.
Lembro que durante o ensino
fundamental eu e meus amigos percebemos que no nosso ano letivo não havia
nenhum festival cultural ou mesmo uma feira de ciências. Então pleiteamos esse
direito junto à direção da escola e conseguimos realizar uma semana cultural em
que toda a escola preparou trabalhos coletivos interdisciplinares que valeriam
nota. Conseguimos fazer um trabalho sobre resíduos sólidos no qual envolvemos
matemática, química, biologia, geografia e até português, pois criamos um
livreto de cordel sobre o tema.
Com esse mesmo grupo, também
conseguimos instaurar um dia diferente na escolha das músicas que tocavam no
recreio, pois o grêmio da escola escolhia sempre as músicas da moda e nós então
pleiteamos e conseguimos negociar um dia para o “rock” e outros estilos
musicais.
São coloridas as lembranças dos meus
tempos de infância e adolescência, com o tempo, a riqueza dessas experiências
foram se tornando escassas, mas, olhando para trás, vejo que tive algumas
oportunidades de participar de processos de criação artística e que também vivi
sabores revolucionários quando resolvi, junto aos meus colegas, questionar as
práticas da escola, pleitear direitos, desenvolver algum gosto pela política e
compreender, na vivência, o seu papel, a sua importância na nossa vida
individual e coletiva. Coisas que só se vive na convivência, na experiência, na
curiosidade e na necessidade de aprender. De certa forma, em alguns momentos a
escola me ensinou por meio do contrário, ou seja, aprendi como não ser e contra
o que eu deveria lutar, a como não ficar totalmente parada e passiva diante da
opressão, da injustiça, etc.
A luta hoje tão atual contra os alarmantes índices
de reprovação que gera a expulsão de
escandaloso número de crianças de nossas escolas, fenômeno que a ingenuidade ou a malícia de muitos educadores e educadoras chama de evasão escolar, dentro do capítulo do
não menos ingênuo ou malicioso
conceito de fracasso escolar. No
fundo, esses conceitos todos são expressões da ideologia dominante que leva as
instâncias de poder, antes mesmo de certificar-se das verdadeiras causas do
“fracasso escolar”, a imputar a culpa aos educandos. Eles é que são
responsáveis por sua deficiência de aprendizagem. O sistema nunca. É sempre
assim, os pobres e miseráveis são os culpados por seu estado precário. São
preguiçosos, incapazes (FREIRE, 1994, p. 119 e 120, grifos do autor).
Um filme passa no meu imaginário
quando busco revisitar minha trajetória escolar, lembro de coisas que aprendi
pela experiência e convivência, momentos em que me deparei com o preconceito, a
discriminação a competição e, também, com a solidariedade e com a amizade.
Aprendizados que estão em mim muito mais latentes do que boa parte da teoria
exposta na sala de aula durante todos os anos da vida escolar.
Não quero dizer que as vivências sociais, culturais,
artísticas e políticas são mais importantes que o conhecimento teórico, mas que
são tão fundamentais quanto. Convêm destacar a justa importância às relações
interpessoais que são oportunizadas no fazer pedagógico, nos espaços da escola
e da comunidade. Experiências que, muitas vezes, a escola negligencia ou
considera secundárias, mas que, na verdade, deveriam ser vistas como centrais
no processo educacional, pois são da ordem do crescimento pessoal e da sensibilidade
e, por serem experiências vividas, deixam memórias que se inscrevem de um jeito
muito latente e sensível em nós. Esse tipo de crescimento é, inclusive, o que
nos dá base para uma boa atividade intelectual.
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